Um reencontro com as tradições, culturas e costumes que andavam adormecidos e que, pouco a pouco, começam a ser redescobertos pelos próprios povos originários que habitam a Paraíba. Foi assim que os participantes avaliaram o 2º Festival de Cultura Indígena da Paraíba organizado pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado da Cultura (Secult-PB) e Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana. O evento foi realizado, nessa quinta-feira (19), no município de Baía da Traição.
O festival, que contou com um investimento de R$ 150 mil, aconteceu no terreiro sagrado da Aldeia São Francisco e reuniu quase 30 aldeias. Havia ainda representantes de Ceará, Pará, Roraima e Mato Grosso do Sul.
Ao término, a ideia que ficou é a de que prevaleceu a parceria entre o Governo da Paraíba e os povos indígenas. “Este evento é fruto de muito diálogo. Porque existe, acima de tudo, o respeito do Governo da Paraíba ao protagonismo dos povos originários da Paraíba. Viemos a Rio Tinto e Baía da Traição inúmeras vezes, conversamos com as lideranças indígenas e montamos a estrutura para o festival conforme as necessidades que eles próprios apontaram”, destacou Pedro Santos, secretário de Estado da Cultura da Paraíba.
Pedro enfatizou também que, pela primeira vez, foi pago cachê para os artistas indígenas que se apresentaram em eventos do tipo, em mais uma forma de dar dignidade à população indígena e reconhecer a sua cultura como expressão artística. “Tenham orgulho de suas culturas e de suas tradições. E lutem! Porque é na luta que a gente transforma a nossa realidade”, discursou durante o evento, falando em seguida sobre “a energia ancestral que pôde ser sentida”, durante os rituais.
Ao longo de dez horas de programação, foram 24 apresentações artísticas de diferentes comunidades indígenas. Antes, porém, o festival foi oficialmente aberto por um ritual sagrado dos Potiguaras. De acordo com as tradições locais, houve a entrega da festa para o deus Tupã e para os ancestrais, como forma de pedir que tudo se realizasse em paz e da melhor forma possível.
Cacique-geral dos povos Potiguara, Sandro Barbosa agradeceu à atenção que o Governo da Paraíba vem dando à causa indígena e destacou que eles se sentem contemplados em um dia como aquele. “É muito gratificante essa ação. É um festival que incentiva as nossas aldeias e que permite um importante resgate de nossas tradições”, explicou.
De acordo com o cacique-geral, parte da cultura indígena andava esquecida, adormecida, mas o festival ajudou a modificar tal realidade. “O cachê que foi pago, por exemplo, faz com que cada grupo cultural consiga investir mais em sua própria cultura, em seus próprios projetos artísticos”, comemorou.
Grupos como o Ka’a Rerekoaretá, que é organizado pelo professor indígena Yby Rerekoará. Ele ensina a língua Tupi e há alguns meses iniciou oficinas culturais que tem como objetivo ensinar arte indígena, incluindo aí o aprendizado de instrumentos como o tambor, a gaita, o chocalho e a flauta.
“É uma forma que encontramos de mostrar a nossa cultura e de revitalizar o nosso idioma. Nossa missão principal é recuperar nossa identidade linguística”, explicou. Naquele momento, inclusive, algo de especial estava sendo pensado. “Vamos dançar o toré, que é o nosso ritual sagrado, e as músicas serão todas cantadas em Tupi”, ressaltou.
Pajelanças e arte
Durante o 2º Festival de Cultura Indígena da Paraíba, os pajés foram essenciais. As lideranças religiosas das aldeias indígenas têm a missão de manter a pacificação dos povos e de contornar eventuais problemas que colocassem em risco o evento.
Joseci Soares da Silva, de 67 anos, era um dos pajés presentes. Ele destacou que é sua função manter a paz no local e garantir que todos sejam respeitados, de crianças a adultos. “A gente protege a comunidade. Evita que problemas ocorram aqui”.
O terreiro sagrado, ele ensina, é o local da pacificação, em que as diferenças são colocadas de lado e que todos são vistos como indígenas. O ritual, ademais, é pensado também para os não-indígenas. “Trabalhamos para que nossas portas estejam abertas para receber todos”.
Além das apresentações artísticas, houve exposições fotográficas, venda de artesanato e de artes indígenas e oficinas de pintura corporal. Sobre esse tema, Clebson Bernardo dos Santos, de 30 anos, era um dos Potiguara mais ativos na realização de pinturas corporais ao longo do dia.
Ele explicou que começou no ofício aos 18 e que, portanto, há 12 anos vem desenvolvendo a sua arte, que tem tudo a ver com a própria crença indígena.
Clebson ensina que “a pintura é um ser espiritual” e que “cada uma tem um significado e uma origem”. Entender essas diferenças, pois, é fundamental dentro da identidade indígena. “Temos pinturas para a paz, para a união de nossos povos, para a caça, a pesca, a guerra, a proteção de território. Para cada ocasião, temos uma pintura”, resume.